quarta-feira, 6 de março de 2019

"Arrependei-vos e acreditai no Evangelho"

Caros leitores (se é que aí estão), eis chegada a hora! O tempo de Deus (como diz no Evangelho de Marcos, donde vem também o título deste primeiro post), já que começa a Quaresma, e também o tempo de começar este blog (já não era sem tempo, ufa!)
Desde já deixem-me dizer antes de mais nada, para este post e para os que se seguirem, não sou um conhecedor digno de filosofia e teologia. Sei muito pouco, mas quem sabe se não chegará para muito. Portanto, quero começar por dizer isto, para aqueles que ainda não sabem. Normalmente, associamos a palavra arrependimento a algo negativo, ao passado, ao pecado que cometemos, a qualquer coisa menos boa da nossa vida. Esta palavra é traduzida do grego "metanoia", que pode querer significar arrependimento no sentido mais corrente da palavra, mas significa principalmente mudança de pensamento, de mentalidade. Compreender que existe outra possibilidade de vida. Um futuro.
Talvez seja essa a primeira Boa Nova do Evangelho: "Mudai de pensamento e acreditai na Boa Nova. Deus (afinal) não é mau. Deus é bom!"

Por aqui talvez se perceba o título do blog, que, longe de ser catchy, foi o possível. Porque, efectivamente, importa pensar e re-pensar. Sob a mesma luz de outros, ou sob outra luz. Da mesma perspectiva, ou de perspectivas diferentes. Para chegar a conclusões iguais, nalgumas coisas, e a conclusões diferentes, noutras. E (e aqui é que é importante), para chegar a formulações diferentes que, não obstante, apontem na direcção do mesmo Deus de amor.
Muitas vezes achamos (individualmente, e enquanto Igreja), que é melhor não pensar, não questionar, não debater, não ter espírito crítico. Pode acontecer que nos afastemos, pensamos. Sim, é um risco. No entanto, sem pensar, não nos afastamos, mas também não nos aproximamos! Não melhoramos a Igreja. Não melhoramos o mundo.

Porque é que escolhi as duas frases no subtítulo do blog? A primeira, de Santo Agostinho, é uma frase que já conheço há muitos anos, e sempre a achei importante. Mostra a relação da crença e da reflexão acerca dessa mesma crença. Uma alimenta a outra, mas primeiro, preciso de ter a humildade de acreditar. "Ousar acreditar", como diz o irmão Alois, de Taizé. Esta premissa necessária não é exclusiva da fé cristã. As outras religiões também a têm, e até a investigação científica precisa de partir de algum conhecimento prévio aceite como verdadeiro para poder construir em cima dele. Sobre Agostinho, cabe aqui dizer que antes de se converter ao cristianismo tinha sido maniqueísta. Há sempre, em maior ou menor grau, influência de outras culturas e crenças no nosso pensamento. Isso não é necessariamente mau, mas significa que podemos e devemos olhar para a mesma coisa de perspectivas diferentes (como é o caso do pensamento filósofo grego e da sua influência no pensamento cristão)
A segunda frase, de Martinho Lutero, é fruto da sua luta contra o que considerava errado na Igreja Católica, que culminou com a sua ruptura com esta. Lutero, que era sacerdote católico, teve de lutar contra si próprio. Parte da sua consciência teve de lutar contra a outra parte, o que se pode imaginar como não sendo muito fácil, não é? Por um lado, fazer parte da Igreja, enquanto comunidade dos filhos de Deus. Ao mesmo tempo, compreender a decadência dessa comunidade. A guerra interior entre a noção de Deus, e o efeito prático dessa noção, visível (para o bem e para o mal) através da Igreja.
Eis as suas palavras: "A menos que eu seja convencido com a Escritura e com claros raciocínios (pois eu não aceito a autoridade de papas e concílios que se contradisseram uns aos outros), a minha consciência está vinculada à Palavra de Deus. Não posso e não quero me retratar de nada, porque não é justo nem salutar ir contra a consciência. Aqui estou. Não posso fazer de outro modo. Que Deus me ajude".
Curioso é que escolhi estes dois personagens sem os ter ligado um ao outro, mas fui procurar qualquer coisa (enquanto estava a escrever este post) e descobri que Lutero era monge agostiniano! (e esta, hã?)
Volvidos alguns séculos, já se admitiu a importância e a razão de Lutero. O próprio Papa Bento XVI, quando ainda era cardeal, disse que se deve obedecer à própria consciência, que está acima até do papa. Não me mandem já para a fogueira (esperem ao menos pelo próximo inverno para me aquecer um bocadinho). Claro que é importante atender às circunstâncias/contextos em que uma coisa é dita (se não estávamos tramados ao ler a Bíblia). Precisamos de ter a humildade para perceber que não sabemos tudo, e que já muitas pessoas pensaram e reflectiram acerca disto e muito mais, antes de nós. Mas temos de ter a noção de que sabemos alguma coisa. Na ânsia de lutarmos contra o relativismo, por termos medo de que isso possa dispersar e confundir as pessoas, acabamos por cair em absolutismos. Nenhum desses "ismos" é bom.

Ora, que é que podemos encontrar neste blog? Nem tudo, nem nada.
Comentários acerca de textos bíblicos;
pensamentos;
pequenas contribuições/novas abordagens que possam ilustrar de um ou outro modo algumas ideias ou frases cristãs.
Partilhas na área da música/literatura/cinema que possam contribuir de igual modo.
Frases que dêem para pensar.
Aquilo que me der na telha escrever.

Irei falar de coisas que estão mais que batidas, mas como já disse, é sempre preciso voltar a pensar sobre algo, quer se chegue à mesma conclusão, quer se chegue a outras.
Irei também, inevitavelmente, falar de temas controversos e delicados. Não o quero fazer com o intuito de dizer mal por dizer, embora às vezes possa utilizar algum humor que possa ser visto como mordaz ou sarcástico. Por vezes precisamos do humor para perceber o ridículo da situação. O meu objectivo é melhorar a Igreja, pois quem acha que está tudo a funcionar bem, pode tirar a cabeça da areia; é-vos permitido.

A ideia inicial era escrever no facebook (onde irei colocar links destes posts), mas ao menos assim a informação fica junta no mesmo local. São livres de comentar/criticar/partilhar/sugerir ideias para novos posts. Quem sabe, talvez no futuro outras pessoas contribuirão para repensar o pensamento cristão.

Let the games begin!

João Barreiro

1 comentário:

  1. Não se pode melhorar a igreja sem nós. E nós é que temos que melhorar porque a ''igreja'' não é uma coisa abstracta. A humanidade está numa confusão que não sei se tão cedo lá chegaremos. O caminho é vosso. A única coisa que posso dizer é pedir desculpa por não ter conseguido fazer nenhuma diferença no meu caminho, aliás desisti disso. Agora ando sózinha de gente, e só com Ele. O silêncio entre nós é uma grande conversa.
    Boa sorte João.

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